CRIME ORGANIZADO
– Paradinho aí! Isso é um assalto!
– Como assim assalto?
– Assalto, assalto, ué! Passa a grana, fica quietinho, não olha pra mim… essas coisas, tá ligado?
– Eu sei o que é um assalto, mas francamente! São nove da manhã! Isso não é hora de assaltar!
– Como não é hora? De que época você é, meu filho? Assalto agora é a qualquer hora…
– Tá, nisso o senhor tem razão… Mas e essa arma ai?
– Quê que tem minha garrucha?
– Deixa eu ver ela aí…
– Que é agora? Tó! Pega com cuidado, po!
– Pode deixar. Não acha que ela está meio velha, não?
– Quem?
– A sua arma.
– Que isso, rapá? Tá maluco? Tu me respeite, que eu tô nesse ramo há mais de dez anos e não admito esse tipo de depreciação!
– Me respeite o senhor! Se vai me assaltar, pelo menos use uma arma decente!
– Olha, você já me cansou! Dá minha arma pra cá!
– Tamo, essa merda!
– Agora vai passando logo a grana aí, antes que eu te pipoque!
– Epa, calma lá! Não é só assim não! Que que é isso? Não existem mais leis neste país?
– Cara, tu tá pedindo!
– Tô pedindo mesmo! Quero ver o registro desta arma aí!
– O registro?
– Sim! E o seu registro também! Quero saber se você é associado da ANABA, Associação Nacional dos Assaltantes e Bandidos Afins.
– Ih, caramba, a carteirinha da ANABA eu esqueci em casa… Serve a da Estadual?
– Serve, deixa eu ver aí…
– Tá tudo legalizado, em dia, tem nada vencido. Tipo… tem essa mancha de café aí que eu derrubei outro dia, mas tá tudo nos conformes.
– Hum…
– Tudo beleza? Passa a grana agora?
– Hum… Epa! Calma aí, calma aí, calma aí…
– Que foi?
– Segundo está escrito aqui sua área de atuação vai do Centro até Bela Vista…
– E daí? Aqui ainda é Centro!
– Aí é que o senhor se engana! O Centro acaba logo ali, na Rua Medeiros. Aqui já é Santa Misericórdia…
– Mas que merda, eu sempre confundo…
– Azar, hein! Desculpe, foi uma honra!
– Peraí, véi, vamo negociar! São apenas cem metros até a Medeiros… Você bem que poderia dar uns dez passinhos grandes para trás, hein…
– Desculpe, meu caro bandido, dura lex sed lex!
– Olha, eu maneiro a mão… finjo que só vi uma parte do dinheiro…
– O quê??? Que absurdo! O senhor está tentando me subornar! Mas não dá pra confiar em ninguém hoje em dia mesmo!
– Desculpa, não falei por mal… é que…
– Olha, vou aliviar pro senhor. Não denuncio pra fiscalização sua tentativa vergonhosa. Mas não vou dar os dez passinhos porque já estou atrasado. Olha, logo ali tem uma padaria onde os caras que trabalham na empresa de informática tomam café nessa hora. Tenta a sorte lá. Ouvi dizer que os malandros ganham bem.
– Ah, obrigado. Puta merda! Vou ter que voltar a pé.
– Só não te dou uma carona porque vou pro lado de lá.
– Tudo bem. Mas que merda! Eu odeio burocracia! Odeio, odeio!
– Eu também, meu caro, eu também… até mais ver!
“Fernando Lago é professor, músico e escritor, autor de Nudus, livro de poesias lançado em 2014 pela editora Penalux”
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